Livro O Rei Se Inclina E Mata

O Rei Se Inclina E Mata, coletânea de ensaios que a Biblioteca Azul acaba de publicar da escritora Herta Müller, é “totalmente autobiográfica”, na definição da própria autora. O livro inicia-se com suas memórias de infância em Nitzkdorf, uma pequena aldeia na região do Banat romeno.

Nela, a menina Herta começa a construir a relação muito própria com as palavras que manteria na maturidade, relação cheia de astúcia, já intuindo que, criadas para se falar e pré-validadas pelos “de fora”, as palavras mais subjugam do que qualquer outra coisa – mesmo quando proibidas de serem ditas.

A pequena aldeia natal de Herta Müller, longe de afirmar-se como integrante da complexa paisagem transnacional da Europa centro-oriental em que se inseria, fechou-se então sobre si mesma, em seu germanismo ou, antes, em seu “suabismo”.

Parte do sistema de cooperativas agrícolas do regime comunista romeno, seu dia a dia era o trabalho no campo em um ambiente pleno de silêncio autoimposto e solidão, mas também permeado de chauvinismo e xenofobia, como logo se dará conta Herta Müller.Já adulta, depois de estudar literatura germânica na capital histórica do Banat, a cidade de Timisoara (quando aprende, tardiamente, a língua de seu país natal, o romeno), essa percepção arguta de Herta Müller se comprova e se acirra no mundo citadino, em tudo avesso ao mundo de silêncio de sua aldeia.

Herta se espanta com a verborragia dos moradores da cidade, sempre falando de si mesmos em tom de lamúria, tendo um eu irreal, histérico, como centro de seus discursos. Essa verborragia estereotipada tem seu auge para Herta quando se vê obrigada a enfrentar a polícia política da feroz ditadura então vigente de Nicolae Ceausescu.

Nos interrogatórios intermináveis, logo percebe o teatro de amor e ódio do censor, e recusa-se a qualquer tipo de interlocução com ele. Nota que cada gesto ou expressão de sua parte que fuja do script predeterminado da Securitat de Ceausescu é suficiente para desconcertar completamente seu interrogador.Na feliz formulação do psicanalista francês Pierre Legendre, “a obra-prima do Poder consiste em se fazer amar”.

Quando o poder se exerce pela força, como nas ditaduras, ele se apodera como nunca da linguagem, procurando por meio dela imiscuir-se na própria e incessante constituição do sujeito, como um amante ciumento que tudo vê, tudo controla e de tudo desconfia.

E se aterroriza e se sente ameaçado quando se depara com discursos que lhe escapam completamente, como observa Herta em um dos ensaios deste livro.Em outra passagem exemplar, Herta conta que, em um de seus períodos de desemprego crônico, provocado pela perseguição da ditadura de Ceausescu, ela aceita dar aulas em uma escola de educação infantil, ou jardim de infância.

Ela julgava então, com alívio, que assim poderia ganharia a vida em ambiente mais salubre, imaginando que crianças tão pequenas ainda não teriam sido contaminadas pelo clima sufocante da ditadura.

Mas logo nas primeiras aulas é surpreendida pela atitude de pequenos censores e delatores das crianças. Elas querem saber, por exemplo, por que a professora não os acompanha quando cantam o hino nacional no início de todas as aulas (na verdade, uma glorificação a Ceausescu), corpos retesados em posição militar.

Acostumados a contínuos castigos físicos, conta a autora que os alunos entram em um vazio histérico quando as surras não chegam. E, quando Herta tenta contar-lhes tradicionais narrativas infantis, eles as rejeitam, pois nelas não há alusões “patrióticas” ao grande líder.Assim, como já assinalado pela crítica, em O Rei Se Inclina E Mata, por meio de rememorações de sua própria história, Herta Müller oferece as chaves da gênese de sua escrita, de alta densidade poética e sintaxe muito peculiar.

No entanto, a despeito dessas características, sua prosa está muito longe de qualquer veleidade literária, de qualquer cacoete esteticista, seja das “belas letras”, seja dos vanguardismos abundantes na região europeia em que nasceu ou das “desconstruções” contemporâneas.

É que o depuramento estético da escrita de Herta Müller resulta simplesmente de um sujeito que se recusa, por meio da linguagem, à submissão e ao servilismo. Seja na aldeia (tão idealizada na literatura romena a ponto de ser tema central de um movimento literário, o Seminatorismo), seja em uma das grande metrópoles do Danúbio como é Timisoara, entre meios, mentalidades e línguas diferentes, Herta Müller mostra que sempre é possível apropriar-se dos mecanismos discursivos institucionalizados e coercitivos, reinventando-os em um pensamento de irredutível liberdade.

Ficha Técnica do Livro

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Autor(es)
EditoraBiblioteca Azul
IdiomaPortuguês
ISBN852505397X 9788525053978
FormatoCapa comum
Páginas216
Livro físico na

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